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Oscar Hidalgo López (1930-2014): A Sistematização do Conhecimento e o Legado do "Aço Vegetal" para a Arquitetura Sustentável

Introdução: O Legado de um Pioneiro – O Arquiteto-Pesquisador

No panteão da arquitetura sustentável, poucas figuras são tão fundamentais e, ao mesmo tempo, tão singulares quanto o arquiteto e pesquisador colombiano Oscar Hidalgo López (1930-2014)¹. Distinto de seus contemporâneos que ganharam fama pelo design de edifícios icônicos, o legado de Hidalgo López não se mede em metros quadrados construídos, mas na monumental tarefa de sistematizar um conhecimento ancestral e transformá-lo em uma ciência aplicada e globalmente acessível. Este relatório busca analisar a profundidade de sua obra, argumentando que sua maior contribuição foi a criação de uma estrutura intelectual e prática que elevou o bambu, especialmente a espécie Guadua angustifolia, de um material vernacular a um componente legítimo da engenharia e da arquitetura moderna.

Conhecido por seus pares e discípulos como "el Maestro" e "O Poderoso Chefão do Bambu" (The Godfather of Bamboo)², sua carreira foi dedicada a uma missão quase apostólica: revelar ao mundo o potencial infinito desta gramínea gigante. Ele não apenas pesquisou e documentou, mas também ensinou, publicou e institucionalizou o estudo do bambu, fundando o Centro de Investigación de Bambú y Madera (CIBAM)⁶ e influenciando diretamente uma geração de arquitetos, incluindo o renomado Simón Vélez⁴. A análise de sua trajetória, suas publicações seminais e suas inovações técnicas revela um visionário cujo trabalho é, hoje, mais relevante do que nunca, oferecendo um roteiro comprovado para um futuro construído de forma mais sustentável.

Índice

1. O Visionário e sua Missão: Trajetória e Contexto

A jornada de Oscar Hidalgo López está intrinsecamente ligada ao seu ambiente cultural e acadêmico. Foi a partir de uma base sólida na Colômbia, um país com uma rica tradição construtiva em bambu e uma biodiversidade privilegiada, que ele lançou as bases para uma revolução global no uso do material¹.

1.1. Formação e Raízes na Colômbia

A carreira de Hidalgo López foi forjada na Universidad Nacional de Colombia⁶, uma instituição que se tornou o epicentro de suas investigações por toda a vida. Ao contrário de muitos arquitetos de sua geração que olhavam predominantemente para as correntes modernistas europeias e norte-americanas, Hidalgo López voltou seu olhar para dentro, para os recursos e saberes de sua própria terra. A Colômbia, com suas vastas florestas e ecossistemas andinos, não era apenas um cenário, mas o laboratório vivo para seu trabalho.

Nesse contexto, a espécie Guadua angustifolia emergiu como a protagonista de suas pesquisas. Endêmica da América Tropical, esta gramínea gigante já era utilizada há séculos em construções vernaculares por comunidades indígenas e rurais, que reconheciam empiricamente sua força e versatilidade⁶. O que Hidalgo López fez foi aplicar o rigor científico a esse conhecimento tradicional, buscando quantificar suas propriedades e codificar suas técnicas de aplicação para que pudessem ser replicadas, aprimoradas e validadas segundo os padrões da engenharia moderna¹¹.

1.2. A Institucionalização do Conhecimento: A Fundação do CIBAM

Um dos passos mais estratégicos e duradouros na carreira de Hidalgo López foi a fundação do Centro de Investigación de Bambú y Madera (CIBAM), em associação com a Universidad Nacional de Colombia⁶. A criação do CIBAM representou um ponto de inflexão: o bambu deixou de ser apenas um "material de pobre" ou um objeto de estudo botânico para se tornar um tema de pesquisa séria em engenharia estrutural, arquitetura e ciência dos materiais.

O centro tornou-se o veículo para suas publicações, como o seminal Manual de Construcción con Bambú⁷, e serviu como uma plataforma para a formação de novos pesquisadores e a disseminação de suas descobertas. A importância dessa institucionalização é imensa. Ela garantiu que o conhecimento acumulado não se perdesse, criando uma base acadêmica sólida que continuaria a crescer e a se desenvolver. O próprio repositório da universidade reconhece que a literatura especializada sobre compósitos de bambu, como o bambucreto, existe em grande parte "graças às investigações desenvolvidas pelo arquiteto Oscar Hidalgo López, que em grande parte de sua vida profissional e acadêmica se interessou pela guadua"⁹. Essa iniciativa transformou um interesse pessoal em um campo de estudo formal, legitimando o bambu na academia e na indústria da construção.

2. A Filosofia do "Presente dos Deuses"

A obra de Oscar Hidalgo López não pode ser compreendida apenas por seus aspectos técnicos; ela é sustentada por uma profunda filosofia que vê o bambu não como um mero recurso, mas como uma solução integral para desafios ecológicos, sociais e culturais. Essa visão está encapsulada no título de sua obra-prima, Bamboo: The Gift of the Gods (Bambu: O Presente dos Deuses), que sinaliza uma reverência quase espiritual pelo material¹⁷. O livro está disponível para consulta e aquisição em plataformas como a Amazon¹⁸.

Sua filosofia é articulada de forma contundente em uma de suas afirmações mais célebres: "Com o bambu, podemos substituir a madeira em todas as suas aplicações, mas não podemos usar a madeira para fazer todas as coisas e estruturas que só podem ser feitas com o bambu"²⁰. Esta frase desconstrói a noção do bambu como um simples substituto, posicionando-o como um material superior em certos aspectos, dotado de qualidades únicas de flexibilidade, leveza e resistência que abrem possibilidades construtivas inatingíveis para a madeira.

Essa perspectiva está enraizada em uma profunda consciência ecológica. Muito antes de a sustentabilidade se tornar um chavão global, Hidalgo López já defendia o bambu por seu ciclo de crescimento ultrarrápido, sua capacidade de sequestrar carbono da atmosfera e seu papel na conservação de bacias hidrográficas e na prevenção da erosão do solo²¹. Para ele, usar o bambu não era apenas uma escolha técnica, mas um ato de responsabilidade ambiental. Além disso, ele via no uso de materiais locais, como a guadua na Colômbia, um caminho para o fortalecimento da identidade cultural e da autonomia tecnológica, gerando um "sentimento nacionalista" positivo e uma arquitetura que responde autenticamente ao seu lugar¹¹.

3. A Matéria-Prima Central: A Guadua angustifolia, o "Aço Vegetal"

No centro da revolução proposta por Oscar Hidalgo López está uma espécie específica de bambu: a Guadua angustifolia. Suas pesquisas foram dedicadas a decifrar e divulgar as propriedades extraordinárias desta planta, que ele e outros ajudaram a consagrar com o apelido de "aço vegetal" (acero vegetal), uma metáfora que captura perfeitamente sua combinação única de leveza e resistência²².

3.1. Características Botânicas e de Crescimento

A Guadua angustifolia é uma gramínea gigante nativa das Américas, encontrada do México à Argentina, com destaque para a Colômbia e o Equador¹⁰. Seu ciclo de vida é notável. Um colmo (o caule do bambu) pode atingir sua altura máxima, que frequentemente ultrapassa 20 metros, em menos de cinco meses, um feito que levaria décadas para uma árvore de diâmetro similar²². Sua estrutura morfológica é uma obra de engenharia da natureza: um cilindro oco segmentado por nós (diafragmas internos), que conferem ao colmo uma incrível rigidez e resistência ao mesmo tempo em que mantêm sua leveza¹⁰. Essa eficiência estrutural intrínseca foi o ponto de partida para todas as suas aplicações na construção.

3.2. Propriedades Físico-Mecânicas

A designação "aço vegetal" não é um exagero poético, mas uma descrição fundamentada em dados empíricos. As pesquisas de Hidalgo López e de cientistas que seguiram seus passos demonstraram que as fibras de bambu possuem uma resistência à tração excepcional. Alguns estudos apontam que a resistência à tração das fibras em um feixe vascular pode chegar a valores que se aproximam do dobro da resistência do aço por unidade de peso²².

Além da força bruta, a Guadua angustifolia possui alta flexibilidade e capacidade de absorver energia, tornando-a um material ideal para construções em zonas sísmicas. Estruturas de bambu bem projetadas podem dissipar a energia de um terremoto através da deformação elástica, em vez de fraturar rigidamente como o concreto²⁴. A tabela a seguir resume algumas das propriedades mecânicas que validam a Guadua angustifolia como um material de construção de alto desempenho.

Tabela 1: Propriedades Físico-Mecânicas Típicas da Guadua angustifolia

Propriedade Valor de Referência Fonte(s)
Densidade (seca) 500–800 kg/m³ Liese & Köhl [6]²⁵
Módulo de Elasticidade (E) 7.000–17.000 N/mm² Liese & Köhl [6]²⁵
Resistência à Compressão (paralela às fibras) ~50 MPa Padovan [7]¹⁰
Resistência à Tração (paralela às fibras) 150–200 MPa Pereira & Beraldo [8]²²
Resistência ao Cisalhamento ~2.5 MPa Sánchez Quintero [9]²⁷

Nota: Os valores podem variar significativamente dependendo da idade do colmo, teor de umidade, posição no colmo (base, meio, topo) e metodologia de ensaio.

A quantificação dessas propriedades foi um passo crucial. Ela permitiu que arquitetos e engenheiros movessem o bambu do domínio da construção vernacular para o da engenharia estrutural, realizando cálculos e projetos com um grau de previsibilidade e segurança comparável ao de materiais convencionais.

4. A Sistematização do Conhecimento: Análise Crítica das Publicações-Chave

Se o CIBAM foi o veículo institucional, as publicações de Oscar Hidalgo López foram o motor intelectual de sua missão. Ele desenvolveu uma estratégia de disseminação de conhecimento em duas frentes, materializada em duas obras principais que, juntas, formam um ecossistema completo de saberes: uma para o construtor prático e outra para a comunidade científica global.

4.1. O Manual de Construcción con Bambú (1974, 1981): A Democratização da Prática

Publicado inicialmente em 1974 e revisado em 1981, o Manual de Construcción con Bambú⁷ foi uma obra revolucionária⁶. Seu propósito não era teórico, mas eminentemente prático: transferir tecnologias de construção para o meio rural e para qualquer pessoa interessada em autoconstrução¹. O brilho do manual reside em sua abordagem pedagógica. Reconhecendo que seu público-alvo poderia ter níveis variados de alfabetização, Hidalgo López baseou a obra em ilustrações detalhadas, claras e sequenciais²⁹. Cada passo, desde o corte e tratamento do bambu até a execução de complexas treliças e pontes, é desenhado com uma precisão que transcende a barreira da linguagem escrita³⁰.

O manual é um guia "como fazer" definitivo. Sua estrutura abrange³⁰:

  • Generalidades: Aplicações do bambu segundo a idade, métodos de corte e cura.
  • Materiais Derivados: Como produzir painéis de esterilla (malha de bambu), canais, ripas e até cabos de tiras de bambu.
  • Uniones y Amarres (Junções e Amarrações): O coração do manual, detalhando dezenas de tipos de encaixes, entalhes, amarrações e fixações essenciais para a estabilidade estrutural.
  • Construcción de Estructuras: Aplicação prática dos princípios em andaimes, pórticos, paredes (bahareque, quincha), telhados, lajes, tanques, aquedutos e pontes.

Este manual democratizou o conhecimento, capacitando construtores em toda a América Latina e além a utilizar o bambu de forma segura e eficiente, tornando-se a principal referência para a construção rural com o material⁶.

4.2. Bamboo: The Gift of the Gods (2003): A Enciclopédia Definitiva

Quase três décadas depois do primeiro manual, Hidalgo López publicou sua obra-prima, _Bamboo: The Gift of the Gods_¹⁸,³³. Se o manual era o guia tático, este livro é o tratado estratégico e definitivo. Frequentemente chamado de "a Bíblia do Bambu", é um volume enciclopédico de mais de 550 páginas que busca consolidar todo o conhecimento existente sobre o material em um único lugar³³.

Seu escopo é vasto e multidisciplinar, indo muito além da construção¹⁹. O livro está dividido em dez partes, cobrindo¹⁹:

  • Botânica e Ecologia: Taxonomia, floração, silvicultura, pragas e doenças.
  • Propriedades do Material: Análise detalhada das propriedades físicas, mecânicas e químicas.
  • Aplicações Industriais e Artesanais: Fabricação de materiais compostos, artesanato e painéis.
  • Tecnologias Construtivas: Regras de construção, fundações, paredes, telhados e pré-fabricação.
  • Engenharia do Bambu: Aplicações em engenharia civil (pontes, estruturas espaciais), aeronáutica, química, mecânica e até no campo militar.
  • Cultura e Medicina: Usos históricos nas Américas e na Ásia, e aplicações na medicina tradicional e moderna.

Esta obra monumental foi o esforço de uma vida inteira de pesquisa e viagens por todos os continentes¹. Seu objetivo era claro: fornecer uma base científica e cultural irrefutável para elevar o status do bambu, apresentando-o não apenas como um material de construção, mas como um recurso global com potencial para transformar múltiplos setores da atividade humana.

5. Inovações e Técnicas Construtivas Detalhadas

O trabalho de Oscar Hidalgo López foi fundamental para traduzir práticas empíricas em técnicas construtivas replicáveis e aprimoradas. Ele documentou e refinou cada etapa do processo, desde a colheita da matéria-prima até sua montagem final em estruturas complexas.

5.1. Do Cultivo ao Canteiro: Tratamento e Preservação do Bambu

A durabilidade de uma estrutura de bambu começa muito antes da construção. Hidalgo López enfatizou a importância crítica da colheita e do tratamento adequado para proteger o material contra o ataque de insetos (como o caruncho) e fungos, que são atraídos pelo amido presente no colmo³⁰.

  • Colheita: Ele sistematizou a prática de colher os colmos na idade correta, geralmente entre 3 e 6 anos, quando atingem o pico de resistência mecânica⁷. Colmos mais jovens são muito tenros, enquanto os mais velhos começam a se degradar.
  • Cura (Tratamento Natural): A cura visa reduzir o teor de amido e umidade. Hidalgo documentou vários métodos tradicionais, cada um com suas vantagens e desvantagens³⁰.

A tabela abaixo compara os principais métodos de cura descritos em seus manuais.

Tabela 2: Comparativo de Métodos de Cura Natural do Bambu (Baseado na Documentação de Hidalgo López)

Método de Cura Procedimento Vantagens Desvantagens Aplicação Recomendada Fonte(s)
Cura na Mata Colmo recém-cortado deixado em pé na moita, apoiado, com folhas/galhos, por 4-8 semanas. Preserva cor natural, evita manchas, baixo custo. Processo lento, requer espaço no bambuzal. Projetos onde a estética da cor natural é importante. Hidalgo [7]
Cura por Imersão Colmos submersos em água (rio ou tanque) por até 4 semanas. Simples de executar. Pode manchar o bambu, perda de resistência se excedido. Método comum (menos recomendado por Hidalgo). Hidalgo [7]³⁰
Cura ao Calor/Fumaça Colmos rotacionados sobre fogo ou expostos à fumaça em ambiente fechado. Processo rápido, fumaça cria camada protetora. Risco de queimar, altera a cor, requer habilidade. Tratamento rápido para peças individuais. Hidalgo [7]³⁰
Tratamento Químico (Boucherie) Solução preservativa (ex: sais de boro) injetada no colmo recém-cortado (transpiração ou pressão). Altamente eficaz, proteção duradoura. Requer produtos químicos e equipamento, mais complexo. Estruturas permanentes, máxima durabilidade. Arce [1]⁷

5.2. A Arte das Conexões: A Sintaxe da Construção com Bambu

Um dos maiores desafios da construção com bambu é a execução das juntas. Devido à sua forma tubular e oca, as conexões tradicionais de carpintaria não se aplicam diretamente. Hidalgo López dedicou uma parte substancial de seus manuais para detalhar uma "sintaxe" de conexões que respeitam a integridade do material³⁰. Os princípios fundamentais incluem:

  • Evitar o Esmagamento: Os cortes em peças que receberão cargas (vigas, pilares) devem ser feitos próximos a um nó (diafragma), que atua como um reforço interno e impede que o colmo seja esmagado³⁰.
  • Minimizar Perfurações: Ele favorecia o uso de amarrações (com arame, fibras vegetais ou cordas de nylon) e passadores de madeira ou bambu em vez de pregos e parafusos grandes, que podem criar pontos de fissura e enfraquecer o colmo²².

Algumas das juntas icônicas documentadas por ele incluem o corte "boca de peixe" (boca de pescado), que permite um encaixe perfeito entre peças perpendiculares, e uma variedade de entalhes e amarrações para diferentes configurações estruturais, como as usadas em andaimes e treliças³⁰. É importante notar que, enquanto Hidalgo documentou amplamente estas técnicas baseadas em saberes tradicionais e princípios de carpintaria adaptada, o arquiteto Simón Vélez ficou renomado por inovar um método estruturalmente superior de conexão, preenchendo o interior dos colmos nos pontos de junção com argamassa de cimento para permitir o uso de vergalhões de aço tensionados, superando o limite de cisalhamento do bambu².

5.3. Aplicações Estruturais e Arquitetônicas

Com a matéria-prima devidamente tratada e um vocabulário de conexões estabelecido, Hidalgo López demonstrou a aplicação desses princípios em sistemas construtivos completos.

  • Paredes: Ele documentou extensivamente sistemas de vedação tradicionais, como o Bahareque, que consiste em uma estrutura de bambu preenchida com uma trama de ripas (esterilla) e revestida com argamassa de barro ou cimento, e a Quincha, uma variação desta técnica³⁰. A resistência sísmica dessas técnicas, quando bem executadas, é notável³⁴.
  • Lajes e Compósitos: Uma de suas áreas de maior inovação foi a exploração de compósitos. Ele desenvolveu técnicas para usar bambu como elemento de alívio em lajes de concreto, reduzindo o peso e o custo da estrutura³⁰. Isso evoluiu para o conceito de "bambucreto", onde o bambu é estudado como um possível reforço para o concreto, um campo de pesquisa que ele iniciou e que continua a ser explorado até hoje⁹.
  • Estruturas Diversas: Seus manuais mostram a incrível versatilidade do bambu, com projetos detalhados para telhados de diferentes geometrias, treliças capazes de vencer grandes vãos, pontes (desde simples passarelas até pontes pênseis) e até sistemas de aquedutos rurais, provando que o material poderia ser a base para quase toda a infraestrutura de uma comunidade³⁰.

6. O Legado de um Mestre: Influência e Reconhecimento Global

O impacto de Oscar Hidalgo López transcende suas próprias publicações e pesquisas. Ele plantou sementes que floresceram em um movimento global, influenciando arquitetos, engenheiros e pesquisadores em todo o mundo. Seu legado pode ser medido em três esferas principais: a prática arquitetônica, o reconhecimento institucional e a continuidade acadêmica.

6.1. Influência na Arquitetura Contemporânea

O legado mais visível de Hidalgo López está na obra daqueles que ele inspirou. O exemplo mais proeminente é o do arquiteto colombiano Simón Vélez. Enquanto Hidalgo foi o cientista e o sistematizador, Vélez tornou-se o artista-arquiteto que levou o bambu a uma escala e a uma expressão estética sem precedentes, com obras espetaculares como o Pavilhão ZERI na Expo 2000 em Hannover⁵. No entanto, as impressionantes estruturas de Vélez são construídas sobre os fundamentos técnicos e os princípios de conexão que foram meticulosamente documentados e divulgados por Hidalgo López⁴. A relação entre os dois é simbiótica: Hidalgo forneceu a gramática, e Vélez escreveu a poesia⁶.

6.2. Reconhecimento por Pares e Instituições

A importância de seu trabalho foi reconhecida internacionalmente. A World Bamboo Organization (WBO), principal entidade global para a promoção do bambu, o homenageia como um de seus "Pioneiros do Bambu" (Bamboo Pioneers)²⁰. Este reconhecimento o coloca oficialmente em um seleto grupo de indivíduos que dedicaram suas vidas ao avanço do bambu. Ao fazer isso, a WBO valida sua contribuição não apenas como um esforço isolado na Colômbia, mas como uma peça fundamental no movimento mundial que busca promover o bambu como uma solução para os desafios globais de sustentabilidade, alinhado com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU²¹.

6.3. Impacto na Academia

Talvez o testemunho mais duradouro de seu legado seja a onipresença de seu nome na literatura acadêmica. Décadas após suas publicações originais, as obras de Oscar Hidalgo López continuam a ser uma referência obrigatória e um ponto de partida para inúmeras teses, dissertações e artigos científicos sobre construção com bambu em universidades de todo o mundo, do Brasil à Europa¹⁷. Pesquisadores que estudam as propriedades mecânicas da Guadua, o desenvolvimento de compósitos de bambu-concreto, ou o design de conexões estruturais invariavelmente constroem seus trabalhos sobre os alicerces que ele estabeleceu¹⁶. Essa contínua relevância acadêmica prova que seu trabalho não é uma relíquia histórica, mas um corpo de conhecimento vivo e essencial.

7. Conclusão: O Aço Vegetal e o Futuro da Construção Sustentável

A análise da vida e obra de Oscar Hidalgo López revela um legado que transcende a arquitetura convencional. Ele não foi um construtor de monumentos, mas um arquiteto de conhecimento. Sua contribuição monumental foi a de pegar um material envolto em tradição e percepções de fragilidade e, através de rigorosa pesquisa, sistematização e divulgação, revelá-lo como o que ele realmente é: o "aço vegetal", um recurso de alto desempenho com potencial para revolucionar a forma como construímos.

Seu trabalho, desde os manuais práticos que capacitaram autoconstrutores até a enciclopédia definitiva que solidificou o status científico do bambu, criou um ecossistema de conhecimento que continua a nutrir inovações. Os princípios de tratamento, as técnicas de conexão e os sistemas construtivos que ele documentou forneceram a base para a espetacular arquitetura de bambu contemporânea e continuam a ser o alicerce para pesquisas de ponta.

Em um século XXI confrontado com a urgência da crise climática e a necessidade de materiais de construção de baixo impacto ambiental, a obra de Oscar Hidalgo López é mais pertinente do que nunca. Ele nos deixou não apenas um conjunto de técnicas, mas uma filosofia: a de que as soluções para os nossos maiores desafios podem ser encontradas na natureza, se tivermos a sabedoria de observá-la, o rigor para compreendê-la e a generosidade para compartilhar o conhecimento. Seu legado é a prova de que o bambu é, de fato, um "presente dos deuses", uma ferramenta essencial para a construção de um futuro mais justo, resiliente e sustentável.

8. Referências Bibliográficas

¹ ARCE-VILLALOBOS, O. Fundamentals of the design of bamboo structures. 1993. Tese (Doutorado) - Eindhoven University of Technology, Eindhoven, 1993. Disponível em: https://research.tue.nl/en/publications/fundamentals-of-the-design-of-bamboo-structures. Acesso em: 20 out. 2023.

² DW DOCUMENTAL. La arquitectura de Simón Vélez, el maestro del bambú. YouTube, 12 out. 2022. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=p9xJE_PFGCw. Acesso em: 19 jun. 2025.

⁴ FRANCO, J. T. Arquitectura en Bambú: la obra de Simón Vélez. ArchDaily en Español, 4 jun. 2013. Disponível em: https://www.archdaily.cl/cl/02-265878/arquitectura-en-bambu-la-obra-de-simon-velez. Acesso em: 19 jun. 2025.

⁵ SIMON VELEZ : GIGAGRASS. ZERI Pavilion - Expo Hannover. Architizer, 2000. Disponível em: https://architizer.com/projects/zeri-pavilion-expo-hannover/. Acesso em: 19 jun. 2025.

⁶ HIDALGO-LÓPEZ, O. Manual de construcción con bambú. Bogotá: Estudios Técnicos Colombianos Ltda., 1981. (Construcción Rural, v. 1). Publicado em associação com a Universidad Nacional de Colombia, Centro de Investigación de Bambú y Madera (CIBAM). Disponível em: https://www.humanitarianlibrary.org/resource/bamboo-construction-manual-manual-de-construccion-con-bambu-0. Acesso em: 20 out. 2023.

⁷ HIDALGO-LÓPEZ, O. Manual de construcción con bambú. Bogotá: Estudios Técnicos Colombianos Ltda., 1981. (Construcción Rural, v. 1). Publicado em associação com a Universidad Nacional de Colombia, Centro de Investigación de Bambú y Madera (CIBAM). Disponível em: https://www.humanitarianlibrary.org/resource/bamboo-construction-manual-manual-de-construccion-con-bambu-0. Acesso em: 20 out. 2023.

⁸ PEREIRA, M. A. dos R.; BERALDO, A. L. Bambu de corpo e alma. Bauru: Canal6, 2007. 240 p. ISBN 978-85-99728-28-4. Disponível em: https://www.canal6.com.br/amostras/iniciais_bambu.pdf. Acesso em: 20 out. 2023.

⁹ SÁNCHEZ QUINTERO, C. A. Desenvolvimento de uma ligação estrutural para construção com bambu Guadua. 2015. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2015. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/335496579_APLICACAO_ESTRUTURAL_DO_BAMBU_-_TESOURAS_DE_DUAS_AGUAS_ANALISE_TEORICA-EXPERIMENTAL. Acesso em: 20 out. 2023.

¹⁰ PADOVAN, R. B. O bambu na arquitetura: design de conexões estruturais. 2010. 183 f. Dissertação (Mestrado em Design) - Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Bauru, 2010. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/89702. Acesso em: 20 out. 2023.

¹¹ HIDALGO-LÓPEZ, O. Bambú: su cultivo y aplicaciones en: fabricación de papel, construcción, arquitectura, ingeniería y artesanía. Cali: Estudios Técnicos Colombianos, 1974. 318 p.

¹⁶ RUGGIERO, M. N. de L. Bambu: do material à [re]descoberta de sistemas construtivos. 2015. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) - Instituto de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2015. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16138/tde-03102015-113132/publico/mirellanassrev.pdf. Acesso em: 19 jun. 2025.

¹⁷ MORALES REGUEROS, L. El arquitecto del acero vegetal. Gatopardo, 16 fev. 2016. Disponível em: https://www.gatopardo.com/articulos/archivo-el-arquitecto-del-acero-vegetal. Acesso em: 19 jun. 2025.

¹⁸ HIDALGO-LÓPEZ, O. Bamboo: the gift of the gods. Bogotá: D'Vinni, 2003. 553 p. ISBN 978-9583342981.

¹⁹ (Referência 19 no texto original não estava na bibliografia fornecida. Mantido o número para consistência com a numeração interna do texto original.)

²⁰ (Referência 20 no texto original não estava na bibliografia fornecida. Mantido o número para consistência.)

²¹ (Referência 21 no texto original não estava na bibliografia fornecida. Mantido o número para consistência.)

²² (Referência 22 no texto original não estava na bibliografia fornecida. Mantido o número para consistência.)

²⁴ (Referência 24 no texto original não estava na bibliografia fornecida. Mantido o número para consistência.)

²⁵ LIESE, W.; KÖHL, M. (eds.). Bamboo: the plant and its uses. Cham: Springer International Publishing, 2015. (Tropical Forestry, v. 10). ISBN 978-3-319-14133-6. Disponível em: https://link.springer.com/book/10.1007/978-3-319-14133-6. Acesso em: 20 out. 2023.

²⁷ SÁNCHEZ QUINTERO, C. A. Desenvolvimento de uma ligação estrutural para construção com bambu Guadua. 2015. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2015. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/335496579_APLICACAO_ESTRUTURAL_DO_BAMBU_-_TESOURAS_DE_DUAS_AGUAS_ANALISE_TEORICA-EXPERIMENTAL. Acesso em: 20 out. 2023.

²⁹ (Referência 29 no texto original não estava na bibliografia fornecida. Mantido o número para consistência.)

³⁰ HIDALGO-LÓPEZ, O. Manual de construcción con bambú. Bogotá: Estudios Técnicos Colombianos Ltda., 1981. (Construcción Rural, v. 1). Publicado em associação com a Universidad Nacional de Colombia, Centro de Investigación de Bambú y Madera (CIBAM). Disponível em: https://www.humanitarianlibrary.org/resource/bamboo-construction-manual-manual-de-construccion-con-bambu-0. Acesso em: 20 out. 2023.

³³ HIDALGO-LÓPEZ, O. Bamboo: the gift of the gods. Bogotá: D'Vinni, 2003. 553 p. ISBN 978-9583342981.

³⁴ (Referência 34 no texto original não estava na bibliografia fornecida. Mantido o número para consistência.)